Sunday, April 26, 2009


As desculpas não fazem delite

Há atitudes que não se justificam. Mas podem enquadrar-se. No sábado, eu e o meu namorado fomos jantar com dois amigos. Tudo indiciava uma noite agradável, apesar da chuva intermitente. Fomos ao Bocca e comemos que nem abades. Na verdade, que nem abades com pouco apetite. Já que a nouvelle cuisine não se compadece de estômagos toscos como os nossos. Mas deparámo-nos com um maravilhoso menu degustativo. Das entradas de vieiras com trufas e caviar aos pratos de bodião com lapas, ao atum tekaki, sem esquecer o pudim de ricota acompanhado de sorvete de manjericão... Tudo regado de um encorpado tinto do Douro. Acabado o jantar e ainda por acabar a conversa, fomos até o Lux. Como estávamos todos numa de serão ligeiro continuámos no vinho. Ficámos junto ao bar e - entre um copo, um fait divers e uma gargalhada - se fez o convívio. Entretanto, descobri que o barman preparava uma bebida decorada com rodelas de pepino. Pedi-lhe uma e gracejei com o grupo, colocando-a nos olhos em jeito de máscara cosmética. Péssima ideia. Esquecera-me do rímel e do eyeliner que de repente me vieram à memória quando vi a cara de horror do meu namorado. Intuí logo o borrão. Antes de correr para a casa de banho atirei, sem pensar duas vezes, a rodela de pepino. Que foi aterrar junto ao peito do empregado. Bastou uma fracção de segundos para me arrepender do gesto. Mas já não o podia suspender. Depois de me retocar, voltei ao bar decidida a desculpar-me. Protagonismo que me foi tirado pelo barman. Antes de me deixar falar, repreendeu-me. Assumi a culpa e pedi mil perdões pela atitude infantilóide. Mas a diversão ficou por ali. Assim como a vontade de ali estar. Senti-me triste e bastante envergonhada.
De volta a casa, e a propósito de atitudes irreflectidas, lembrei-me do Pepe, o jogador que está na berlinda por ter agredido ao pontapé um adversário em pleno jogo. Não sei o que se passou na cabeça dele. Nada justifica a violência, mas recuso-me a crucificá-lo... Por detrás ou ao lado do gesto, há sempre um contexto. Há atitudes que não se justificam. Mas podem enquadrar-se. Pior do que o repúdio de quem testemunhou o episódio, pior do que o castigo das entidades reguladoras e pior do que tudo é a severa auto-censura. O rapaz está com certeza arrependido do que fez. E, se não sabia, ficou a saber que as desculpas não fazem rewind. Nem delite.