Sunday, November 28, 2010

Eu sou assim. Não é quando posso. É quando a cabeça quer. Ela é que manda. Definitivamente. Quando estou folgada e tenho o tempo todo não me apetece escrever. Ou apetece-me menos.

As ideias são do contra. Não afluem. Nem fluem. Enfim…

Gosto realmente de escrever quando tenho em paralelo uma série de outras coisas supostamente mais importantes para fazer. Quando outros compromissos se sobrepõem em matéria de urgência. Nesses momentos, dissipo as dúvidas. Não que as tenha já. A minha arte é a escrita. Não me paga as contas. Mas faz-me festinhas à alma.

Não escrevo a metro. Quando me colocam um número de caracteres em perspectiva atrofio logo. Não aprecio que me digam o tamanho da escrita que faço. Nem para mais nem para menos. Escrevo até passar a ideia que se me atravessa. Por norma sou sucinta. Tenho alergia a floreados. Na minha opinião, são um péssimo disfarce de quem tem pouco ou nada a dizer.

Thursday, November 25, 2010

Não me sinto habilitada a fazer o luto pela avó Ainim. Francisca de sua graça. Não sei quando ou por que razão surgiu o petit nom. Sei é que todos os que lhe eram queridos a tratavam assim.

Não me sinto habilitada a fazer o luto pela avó Ainim. Recusei-me fazê-lo então. Não me parece que o faça alguma vez. Por ela continuo a ter um amor tão grande, tão grande, que não cabe neste texto. Não caberia num livro. Nem mesmo numa mega produção galardoada.

A minha avó morreu cheia de vida. O paradoxo talvez explique a renitência em aceitar que me deixou. Eu tinha quinze anos e estava tudo menos preparada para perdê-la. Fiquei desesperada. Quando a vi de boca puxada ao lado pela maldita trombose fugi. Em vez de abraçá-la, fugi. Fechei-me na casa de banho. Histérica. Ufa, a dor ainda me atravessa o peito. Por vezes sara. Por vezes sangra. Mas a psicanálise deixo para depois. Para as instâncias próprias.

Não perdi completamente a avó Ainim. Tenho-a de forma diferente. Divido com ela os momentos bons. Os maus também. Até os assim-assim. Continua tão presente na minha existência, que quase lhe sinto o Anaiis da Cacherel.

E tão ausente, que me fazem falta tantas coisas banais. Os bracinhos flácidos e macios que eu apalpava vezes sem conta em jeito de mimo. O sumo de laranja que nas manhãs de inverno me levava à cama com uma “pontinha” de açúcar e muitas palavras doces. As repreensões pouco veementes que eu só reconhecia porque ao invés de Gracinha me chamava de Graça Maria. As cantorias que improvisava sempre que se embrenhava nas lides domésticas. As idas à missa seguidas de almoço fora onde me deixavam escolher bife, batatas fritas e sumol de ananás. A cumplicidade feita de muitos serões no sofá a ler-lhe as legendas do Dallas. As frases tão dela como “a menina não tem querer” ou “isto não é brincos para a menina”.

Não estou habilitada a fazer o luto da avó Ainim. Nem quero já. Gostava apenas que doesse menos a falta que ela faz.

Wednesday, November 24, 2010

Detesto ser bafejada pelo fumo dos outros. Fumei durante quinze anos. Tempo suficiente para perceber que sou adversa ao fumo e às pessoas que fumam para cima de mim.

O clique aconteceu quando a pneumologista me encostou à situação: “ou fumas ou vives.” O baque foi tal que nem liguei ao facto da estúpida me tratar por tu como se fosse amiga lá de casa. Essa modinha tola de alguns doutorzinhos falarem de cima com os utentes é realmente uma coisa que me transcende. Faz-me ranger os dentes de irritação. Como se não bastasse o tom condescendente, ainda tratam por tu pessoas que os podiam ter parido. Por exemplo. Esquecem eles que o respeito é uma coisa linda de usar.

Voltando à consulta e à sentença de fumadora condenada por um início de enfizema pulmonar,

a primeira questão que me coloquei foi esta: “Como vou escrever o raio do texto?” Trabalhava na RTP Madeira. Tinha feito a reportagem no terreno. Não me lembro já do que se tratava. Seguiu-se a consulta. Seguia-se a redacção e edição da peça. Mas, como os cãezinhos de Pavlov salivavam ao som da campaínha, eu condicionara a escrita ao acto de fumar. Só começava um texto depois de acender o cigarro. Mesmo assim, e absolutamente convencida que tinha de mudar de carreira, mal saí da clínica espezinhei o maço de Marlboro Lights.

Quanto ao texto, foi complicado. Muito complicado. Não consegui apanhar o ângulo certo. Escrevi e apaguei vezes sem conta. Detestei o resultado final. Fui repreendida pelo chefe de redacção pela demora. E só graças ao cross do colega de edição a peça entrou no jornal da noite. Fiquei a milímetros de um ataque de pânico. Assim começou a minha luta contra o fumo. Um processo interrompido algumas vezes. Com as desculpas mais rotas do Planeta. Foi deveras doloroso. Mas valeu bem a pena. Num dos pratos da balança pesa a intolerância com os fumadores à minha volta. No outro, e com um peso bem mais significativo, está a saúde dos meus pulmões. Apurado o custo de oportunidade, o fumo perdeu. Sem margem para hesitações.

Monday, November 22, 2010


Queda para o trambolhão



Desde cedo percebi a desastrada que estava predestinada a ser. A confirmação tive-a no liceu. A partir daí tenho somado um rol de disparates sem conta. Tudo devido à minha incontinência verbal.

Voltando ao liceu, tinha um professor de inglês que mal continha o olhar lascivo na minha direcção. Incapaz de disfarçar o entusiasmo, mandava-me ao quadro o dobro da vezes que seriam razoáveis. Olhava-me sobretudo para o peito que, já na altura, resvalava para o generoso. Não sei se estou ou não a ficcionar mas quase juro que o coitado até deixava escapar umas gotas de suor do rosto ruborescido.

Durante a frequência destas aulas, conheci uma rapariga com a qual empatizei. Quando já éramos quase amigas, descobri que era filha do dito cujo. Soube-o da forma mais inconveniente possível. Perguntou-me ela quem me dava aulas de inglês. Na ignorância, respondi: “Um porco gordo que baba sempre que me vê. E não pára de me olhar para as mamas. É aquele da barbicha à tarado, o professor X.”

Tão entusiasmada estava na minha descrição que não topei a mudança de fisionomia da minha quase amiga. Só reparei efectivamente quando, com alguma rispidez na voz, me disse: “É o meu pai.”

Naquele momento, gelei. O tempo parou. As palavras secaram-se-me. Consegui, ao fim de uns segundos agoniantes, esboçar uma espécie de pedido de desculpa. Atabalhoada saíu-me apenas: “ Upsss... Não sabia que era teu pai.”

Excusado será dizer-vos que a nossa amizade, ainda em fase embrionária, ficou por ali. Foi o primeiro deslize de que tenho memória. Achei que seria o último. Mas, na verdade, a minha queda para o trambolhão é já um traço de personalidade. Nada a fazer.

Thursday, November 18, 2010

Rosa ou vermelho? Rosa.

Pergunto-me vezes sem conta se já não está na hora de preferir vermelho. A resposta é sempre negativa. A favor do rosa. Talvez por achar vermelho cor de “senhora”. Talvez porque sempre que penso em vermelho, me vêm à ideia o tailleur e as unhas da minha mãe. Talvez por considerar vermelho rosa maduro. Talvez por temer a maturidade que reconheço no vermelho. O facto é que entre o vermelho e o rosa, o rosa vence. Mas não tenho nada contra o vermelho. Até gosto. Só não tanto quanto ao rosa.

O que não gosto mesmo é de castanho. Sinto-me triste de castanho. Aprecio numa ou outra pessoa. Em mim é que não. A minha avó, adepta fervorosa de cores garridas, costumava dizer “castanho é cor de velha”. Ela que tanto medo tinha de envelhecer… Herdei-lhe isso. A aversão ao castanho. E o horror ao envelhecimento.

Monday, November 15, 2010

Sou excessiva. Amo muito as pessoas que amo. Amo mesmo demais as pessoas que amo. Só não odeio demais as pessoas que odeio porque não odeio de todo. Mas as pessoas de quem não gosto, não gosto mesmo. Já não tenho idade nem paciência para contornar. Não gosto e acabou. Não há lugar na minha vida para as pessoas de quem não gosto. E quando não gosto, não gosto porquê? O principal motivo é não gostarem de mim. Porque gostar implica dois interlocutores, no mínimo. Quando um deles não dá, o outro não pode dar de volta. Não vou ao encontro de quem não vem ao meu. Já fui. Não vou mais. Simplesmente não vale a pena. Sobretudo por uma questão de auto-estima. E poupança de energia.


Friday, November 12, 2010

De metro até Paris


Esta manhã fui até Paris dos anos 50 e 60. Por entre os acordes de um músico errante. Fui de Metro. Entrei na Alameda e saí no Cais do Sodré. Quando era suposto sair na Baixa Chiado. Mas a distração valeu a pena. As melodias entoadas pelo acordeão tosco e grosseiro levaram-me a passear pela cidade da luz de outros tempos. Fui pela mão de Edith Piaf e Jacques Brel. Dei por mim a trautear “Ne Me Quitte Pas”, “La Vie en Rose” e “Non, Je Ne Regrette Rien”. Imaginei-me perdida, ou encontrada, na penumbra de fumo de um bar boémio, a ver e ouvir as duas grandes vozes do amor e do drama cantados em francês. Estava de vestido carmim com um decote generoso, acompanhada de figuras proeminentes da literatura como Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre, a beber champanhe e a exibir uma boquilha enorme (mais pelo estilo do que pelo vício). Um pouco ao estilo do Midnight in Paris de Woody Allen. Senti-me romântica. Senti-me inebriada. Senti-me feliz.
À saída perscrutei as moedas que tinha e deixei-as todas na caixa do Aladino que me transportou àquela atmosfera de sonho. Ao fazê-lo, senti-me tola. Quero dizer, fizeram-me sentir tola as pessoas que me olharam incrédulas e de sorriso trocista. Lamento se não visitaram Paris esta manhã ou alguma vez. Lamento se não ficaram arrebatadas de emoção com as vozes grandes ali evocadas. Lamento se não visitaram os cabarés parisienses nem deambularam pelas sumptuosas avenidas da capital. Não sei se o fizeram ou não. O que sei é que me olharam como se fosse feio “pagar” por uns minutos de prazer. Olharam-me como se estivesse a alimentar a mendicidade. Estava apenas a gratificar uma despojada manifestação artística. Ou nem tanto despojada. Já que a intenção do músico era angariar trocos. Mas que importa isso? Saímos ambos satisfeitos. Ele, com a caixinha menos leve. Eu, de alma mais cheia.

Wednesday, November 10, 2010

E porque uma nova semana se avizinha, e porque prometi, e porque nada de mais interessante me ocorre, estou cá de novo. A escrever. Ainda não sei sobre o quê. Juro que estou em branco. De frente para a folha branca do word.

Ups, ocorreu-me partilhar uma indignação. Há dias, vi num vídeo duas pessoas a serem espancadas em plena Rua de Santa Catarina, no coração do Porto. Tudo porque se encontravam numa troca de afectos libidinosa. E uns seres de mentes tacanhas, não satisfeitos com uma simples chamada de atenção, largaram de arrear nos ditos amantes. É que o acto sexual, implícito (já que ambos se encontravam vestidos e de genitais resguardados), incomodava muita gente. Estranho é que os estalos e os pontapés não tenham surtido o mesmo efeito. Quase impávidos e pouco serenos (mas a favor dos algozes), os passantes testemunhavam o julgamento popular como se fosse tudo muito razoável. Qual tempo da Inquisição, qual quê… A moral e os bons costumes têm mais é que ser defendidos, ainda que a soco e pontapé. Sei lá, deve ter sido mais ou menos isso que pensaram. Esqueceram-se, porém, que a violência é um quadro bem mais reprovável do que sexo em praça pública.

Fiquei em estado de choque com o que vi. Juro que me sinto ameaçada. Psicológica e fisicamente. Como se vivesse num escuso país de Leste, paredes meias com as máfias de rua.

Tuesday, November 09, 2010

Fodam-se mas é… Desculpem os maus modos mas estou absolutamente cansada de ouvir “estou fodido(a)”. E sem que a exclamação implique sexo. Ainda se fosse…

“Estou fodido” é proferido vezes sem conta de forma ligeira, querendo apenas dizer estou lixado, irritado, furioso. E, parecendo que não, a maior parte das vezes “estou fodido(a)” significa simplesmente o contrário do que se diz. É como que desabafar “estou com ganas de foder” ou “estou a precisar de uma contra a parede”.

Não querendo divagar sobre a intimidade dos outros, sobretudo a de quem não conheço, atrevo-me a conjecturar que a razão primeira de todas as irritações, ou quase todas (vá lá), é a falta de sexo. Não é à toa que as pessoas mais azedas são as menos resolvidas a esse nível. Ou não têm companhia de cama ou a que têm apenas faz uso dela para dormir. É triste mas assim acontece muitas vezes.

Wednesday, November 03, 2010

Ah pois é… Estou a vislumbrar uma vontadezinha ténue de escrever. Na verdade, não sei se efectivamente a tenho. O que estou, isso sim, é a mandar comandos ao cérebro a fim de voltar a ter vontade de fazê-lo. É tempo de tornar a pôr as ideias em dia. Além disso, a pressão tem sido muita. Muita, muita não. Já estou a divagar… Tomara eu. Não tenho um universo de leitores tão significativo. Tem sido alguma.

Ainda ontem celebrava a nova contratação do Pedro, quando de repente os meus textos vieram à conversa. A ausência deles, mais precisamente. Foi num agradável afther work, entre o copo de vinho e o non sense da descompressão, que os meus amigos me repreenderam.

A Patrícia classifica de escandalosa a inércia em que me tenho deixado estar. Diz ela que o mais importante, o talento, está do meu lado e que só me falta meter mãos à obra. Que é como quem diz, puxar pela cabeça e fazer os dedos ao teclado. O Pedro não poupa adjectivos superlativos à forma e estilo das minhas redacções. O que eles não entendem é que, no que me diz respeito, isto de escrever não é de encomenda. É mais uma coisa de combustão espontânea. O certo é que ambos, cada um a seu jeito, me fizeram perceber que tenho perdido tempo e caracteres este tempo todo.

Se sempre escrevi sobre quase tudo por que razão passei a escrever quase nada? Eis o mote da reflexão… E porque sem objectivos não há disciplina, assumo convosco o compromisso de “postar” um texto por semana. No mínimo. Ainda que tenha de recorrer a substâncias recreativas… Ei, estou a brincar. Naturalmente. Agora sou uma ex-tóxico. Lol