Monday, April 16, 2007

Não sei se volto a encontrar-te Tatiana. Apenas sei que me tocaste o coração esta manhã. Tu que - por coincidência ou não – sofres, ou julgas sofrer, do coração. Tão pequenina, tão bonita, tão frágil. E tão carente... Foi assim que te encontrei na estação do metro. Ou melhor, foi assim que me encontraste. Estava eu à volta do rímel (aproveito normalmente a viagem para mascarar os traços de sono e cansaço) quando percebi que me observavas com um sorriso embevecido. Sorri-te de volta e continuei a cobrir as pestanas. Nem te considerei muito. Tão empenhada estava nas minhas vaidades.
Até que o metro chegou e fizeste questão de sentar-te ao meu lado. Contrariando assim a tua mãe, que optou pela bancada da ala oposta. Aí sim, percebi que estavas de olho em mim. E antes de chegarmos à estação seguinte, abordaste-me com timidez: “Está muito bonita...” Percebi que também desejavas ficar mais bonita. Quando estava a pôr brilho nos lábios, coloquei um pouco no teu indicador minúsculo para experimentares. Ficaste radiante. Foi quando perguntei como te chamavas e quantos anos tinhas. “Seis”, respondeste como se dissesses dezoito. Tão senhora de ti.
Continuei, entretanto, com o meu ritual de beleza. Mas tu querias atenção. Tocaste-me no braço e com algum embaraço declaraste: “Estou doente. Tenho um dói-dói no coração.” No mesmo instante, levantaste a camisolinha para exibir a bandeira da tua preocupação: uma espécie de penso cheio de fios a sair-te do peito. A “engenhoca”, aparatosa, deixou-me hirta e sem palavras. Pensei logo que a coisa era séria (só depois descobri que o aparelho era uma espécie de teste ambulante para medir os batimentos cardíacos das crianças).
Assim que recuperei o fôlego, perguntei se tinhas dores. Fizeste que não com a cabeça mas acrescentaste que tinhas desmaiado. Foi então que reparei o quão assustada estavas. Disse-te que desmaiar não era nenhum bicho de sete cabeças. Sem, no entanto, conseguir evitar o tom condescentente (perdoa-me a falta de jeito para lidar com a doença). Disse-te ainda que também perdia os sentidos às vezes. Sobretudo, quando estava muito calor. Foi o que me ocorreu dizer. Acho que consegui sossegar-te. Fiquei com essa impressão quando me deste a mãozinha e sorriste apaziaguada. Deixaste-me sem jeito até o final da viagem. Tão sem jeito que quando saímos, na estação terminal, decidi despedir-me e apressar o passo.
Fiz o resto do percurso a pensar em ti. E no teu medo de estar doente. E na tua vontade de partilhar isso com outra pessoa sem ser a tua mãe. Talvez quisesses poupá-la. Talvez tivesses necessidade de ouvir outra opinião. Talvez, e quero acreditar, tivesses visto em mim alguém capaz de acalmar o teu desassossego.
Desejo muito que estejas bem, Tatiana. Um beijinho.