Wednesday, December 14, 2011



Ao chegar das aulas, pressente a má notícia. A poucos metros de casa, o coração aperta-se-lhe com o burburinho que escapa lá de dentro. Porque dois e dois são quatro, não precisa de entrar para saber o que se passa. Tomara estar enganada. Mas dois e dois são mesmo quatro. O tempo está de tempestade. E o pai, mais por necessidade do que por teimosia, foi para o mar. Tomara estar enganada. Antes fosse cinco ou outro número qualquer. Não está preparada para um fado destes. Ninguém está. Ela menos do que alguém. A dor de cada um só cada um é que sabe.
Ao passar a porta depara-se com a mãe, desgrenhada, num pranto. “Oh filha, o pai não voltou do mar…”, a dor abafa-lhe a frase. A mesma dor emudece as perguntas da recém chegada. Uma dor sem tamanho de tão grande que é. Maior ainda porque se junta à dores das pessoas que ama. A mãe sem norte numa ladaínha de ai Jesus. Os manos e as manas num choro aflito à volta da mesa. Faltam os dois mais velhos, que aguardam novidades junto ao cais. Com eles estão também familiares dos outros dois pescadores e responsáveis pela capitania.
“O telefone que não toca. E o meu homem que já não volta…” Inconsolável, Maria do Amparo teme o pior. Não consegue evitar lamento atrás de lamento. Maria do Mar não se entrega. Mantém a esperança viva. Afinal, neste momento, ausência de notícias significa boas notícias. Não há corpo não há morto. “Calma, mãe. Não aconteceu nada. Tenho a certeza. O pai vai voltar. Anda daí, veste um casaco e vamos até à praia saber  mais coisas…”
“A polícia mandou a gente embora, filha. Só deixaram ficar o João José e o Eleutério. Eles vão ligar assim que souberem o que aconteceu.” E prossegue, virando-se para o quadro da última ceia dependurado na parede, em registo desesperado. “Deus pai, não me leves o meu homem. Ai, por tudo o que é mais sagrado, tem piedade desta família. Ai Jesus, o meu homem não...” 

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