Monday, June 26, 2006


Geneticamente foleira

“Pior, ela não é feia… Ela é geneticamente foleira.” A frase desperta-me da inércia de mais uma viagem a caminho de casa. Ao meu lado, duas produtoras de televisão ou algo parecido falam de outra pessoa. A conversa chega-me aos ouvidos entre-cortada, entre a poesia de Carlos Drumond de Andrade e os ruídos de fundo. Passa-me quase ao lado até que a expressão “geneticamente foleira” me faz erguer o sobrolho de curiosidade. Confesso que me deixa deliciada. Não ouvia uma tão ridiculamente engraçada desde “trolha enough”. Na altura era pouco mais do que adolescente e trocava o piropo com a minha maior amiga, entre risadinhas tão parvas quanto cúmplices. Era adjectivo obrigatório sempre que uma de nós, movida pela natural explosão de hormonas, conhecia um rapaz giro ou fisicamente apelativo mas aquém das nossas exigências intelectuais. O “trolha enough” tinha para nós um significado muito idêntico ao do rapaz do anúncio da Coca-Cola Light.
Voltando ao epíteto “geneticamente foleira”, tanto quanto percebi estabelece que os traços fisionómicos, por exemplo, podem constituir um motivo de avaliação social. Segundo uma das interlocutoras, há características que determinam se a pessoa é ou não “geneticamente foleira” e dificilmente são contornadas pelo estatuto ou quaisquer outros adereços adquiridos. Não me vou apoderar da expressão. Mas confesso, com embaraço, que me lembro dela por vezes para “etiquetar” algumas figuras que conheço. É discutível, facciosa e até segregadora, mas simplifica muitas considerações. Uma vez ou outra, dou por mim a pensar nesta ou naquela pessoa bem sucedida, elegante e inteligente a quem falta um “je ne sais quoi”. No caso, a ausência de “je ne sais quoi” é o pormenor que a faz ser “geneticamente foleira”. Uma patetice, claro…

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