Monday, November 28, 2011


Maria do Amparo deixa de estar um pouco inquieta para estar muito preocupada. Em casa todos dormem à excepção dela e do filho mais velho. O marido veio cansado e deitou-se cedo. “Graças a Deus. É menos um que s’apoquenta…”, conclui  agradecida pela circunstância.
À quinta-feira,  a filha chega por volta das vinte e três horas. Já com o desconto dos mimos ao namorado. “Se calhar perderam o autocarro. Ou andam os dois nos melos. E eu aqui que não m’aguento dos nervos. Que raios… A que horas vai ela comer?” Maria do Mar tem sempre a mãe à espera. E o jantar, tapado com um guardanapo (não vão as moscas fazer banquete).
Os ponteiros do relógio marcam meia noite e quarenta. E prosseguem o movimento a cada segundo que passa.  Não há preocupação que os retenha. Porque o tempo existe. E vai  existir sempre. Alheado dos contextos que o envolvem.
Sem aguentar de aflição, Maria do Amparo prepara-se para sair à procura da cria. Já de casaco aos ombros, o telefone toca. Corre a atender, com o coração a sair-lhe pela boca. Do outro lado, Maria do Mar. “Mãe…”, sufoca num choro convulsivo.
“Então filha, o que tens? O que foi  c’aconteceu? Tou pr’aqui numa tormenta que só Deus sabe… Estás onde?”
“O Kadhafi acabou comigo, mãe. Arranjou outra… ”, o choro inadvertido não a deixa concluir a frase.
“Tem calma, filha. Tudo tem solução. Só não há remédio pr’à morte.” 
“Ainda estou no Funchal.”
“Nossa senhora nos valha! E agora como é que vens pr’a casa? A esta hora da noite não há autocarros…Onde é que tás?”
“Na Marina. Desculpe mãe, o tempo passou sem dar por isso…”
“Fica ao pé da paragem. O mano vai já ter contigo. Tem calma.” 
Entretido com um filme de acção, João José ainda não sabe que a vai buscar. Alheio às horas, não dá pelo atraso de Maria do Mar. Mas em poucos segundos a mãe põe-no a par do que se passa. Sem vacilar um instante, corre do sofá para a mota no encalce da mana. E segue veloz. A protestar contra o estuporado que a faz sofrer.

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